“Ouça-me com atenção, e não olhe para trás
– nem agora nem nunca mais!
Sou aquele que não deve ser encarado nos
olhos,
feitos de morte.
E se por alguma razão esqueceu a cor de meus
olhos,
por favor, nunca mais volte!
Pois,
com meu olhar,
seus amargos pesadelos posso
(de novo)
acordar.”
– O Passado.
Quem fomos, quem somos, quem poderemos ser...
Bem sabemos que uma coisa leva à outra, como uma
progressão, uma questão de causa e efeito, o que me leva a pensar
no passado como um agente condutor – direto ou indireto – dos
rumos que seguimos. Ou pelo menos como um fator que causa uma
influência mínima em tudo isso.
O passado costuma nos lembrar de quem deixamos de ser ao
seguirmos com o processo natural de transformação; isto é, se
lembrarmos de aprender com ele, o passado, sem antes acusá-lo de ter
provocado nossas misérias.
Eu mesmo tenho o hábito de consultar meu passado para
tentar entender como foi que vim parar aqui. Penso que, em algum
ponto específico no tempo, algum evento veio a ser a causa de tudo o
que aconteceu depois. Mas não apenas reflito e em silêncio rumino
sobre essas coisas sem nem ao menos tentar fazer algo a respeito,
apesar de (eu confesso!) ter agido assim algumas vezes. Na verdade,
eu gosto de observar meu passado para tentar descobrir ou redescobrir
tudo o que ficou mal resolvido, e assim busco meios para tentar
fechar as pontas soltas. É como ser o meu próprio terapeuta, em busca do meu próprio
equilíbrio.
Sinto que as pessoas, por outro lado, tentam fugir
disso. Elas seguem em frente e não arriscam olhar para trás. É até
compreensível, considerando o quão doloroso aquele
passado deve ter sido para quem o experimentou, considerando que
todos nós colecionamos inúmeros fantasmas.
Mas isso tem um preço.
Por temerem olhar nos olhos de seus respectivos
passados, as pessoas vivem eternamente assombradas por fantasmas, e
perdem o sono, e são eternamente atormentadas por pesadelos e até
por pensamentos destrutivos de estimação que nunca vão embora, não
sem antes receberem uma ordem expressa de seus donos.
Pois de nada adianta tentarem ignorar a existência de
todas essas coisas.
Eu não sei.
Tenho a impressão de que as pessoas temem olhar para
trás porque temem que tal visão possa paralisá-las e prendê-las
num eterno estado de inércia, enquanto o passado se aproxima e
derruba tudo o que estiver pela frente, incluindo elas. Por esse
motivo, vivem correndo.
“E ao revisitar páginas viradas
de histórias que nunca foram,
de
fato,
superadas,
em meus olhos pode encontrar
um mal
com o poder de convertê-lo numa estátua de sal.”
– Também de autoria do Passado.
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