(Ou o mais adequado seria "Complexo de Hiena"?)
Quando
as pessoas me veem na rua, elas costumam me perguntar o motivo de eu
estar bravo. É a pergunta favorita de pesquisadores, de vizinhos e
de outras tantas pessoas que me veem apenas por alguns instantes, principalmente quando estou caminhando e tudo o que quero
é cuidar da minha vida; afinal, não estou pedindo muito, não é
mesmo?
Que
nada! Estou bem, e obrigado por perguntar. Tenho um pouco de
sensibilidade à luz e faço caretas por esse motivo, sem contar que
eu herdei o semblante sério de meu pai.
Na
verdade, eu até sou bem risonho, se quer mesmo saber, ainda que não
viva sorrindo publicamente sem ter encontrado bons motivos para isso.
Sorrir mostrando meus dentes, então... Isto eu faço apenas sob
coação.
Uma amiga certa vez disse que os dentinhos separados dela
não são para qualquer um, e bem sei o que ela quis dizer. Não é
uma simples questão de esconder algo que não considero lisonjeiro
em mim ou de ignorar os grandes benefícios que, sim, eu sei, o
sorriso traz à nossa saúde, mas pessoalmente considero o sorriso –
ou mesmo o riso – muito mais valioso quando surge pontualmente como
um contraponto à seriedade, quando menos se espera, e isto é o que
me leva a rir melhor.
Mas
banalizaram o sorriso.
Banalizaram
as risadas.
Com
o tempo, as pessoas se vestiram em pele de hiena.
Ou
as hienas vestiram as nossas carcaças humanas, e agora habitam entre
nós, mal disfarçando a sua hilaridade gratuita. São criaturas
jocosas, essas hienas de plantão!
Não
que o riso seja em si um problema, e não é, mas pensando bem, não
me surpreenderia de às vezes me surgir o ímpeto de perguntar o
motivo das risadas.
De
fato, rir é melhor que chorar, como dizem; não há o que discutir a
respeito. Contudo, às vezes eu tenho a nítida impressão de que as
pessoas não sabem nem do que estão rindo, mas não por serem
naturalmente risonhas tal como o Feliz dos sete anões ou o gato da
Alice, e sim por uma certa demência que tem o riso como um elemento
exigido e desesperadamente garantido, como que essencial para a sua
demente existência.
Tudo
bem, eu sei que nós aprendemos a rir de nós mesmos e do desnorteio
de nosso cotidiano, apenas para citar um exemplo comum. Rir de uma
dificuldade sofrida coletivamente alivia a tensão e aproxima
desconhecidos que, não fosse a repetição de uma mesma história em
comum, talvez nunca dirigiriam uns aos outros palavras,
olhares ou acenos silenciosos indicativos da compreensão de algo
percebido ou presenciado em conjunto. O riso pela empatia, como a piada interna de um grande grupo. Neste sentido, o riso é
saudável e natural.
Contudo, o riso não pode simplesmente preencher
o vazio de nossa incompreensão não confessada ou mesmo disfarçar a
nossa falta de atitude diante das dificuldades, sendo mais honesto
confessarmos a nossa ignorância. Embora, em alguns casos, o riso
possa ser visto exatamente como um atestado de ignorância, sendo uma
consequência disso, como quando rimos ou fazemos chacota de coisas
que precisam ser levadas um pouco mais a sério.
Mas
esta é uma questão muito polêmica!
Defensores
do riso acreditam que ele deve estar presente mesmo nos momentos em
que se faz inconveniente. Isso torna a vida mais suportável.
Tudo
bem, eu concordo: o riso pode mesmo ser benéfico.
Isto
é, antes de as hienas entrarem em cena.
Você
conta uma piada muito boa e é aplaudido.
Você
fala sobre assuntos mais complexos, sobre coisas que demandam um
pouco mais de contemplação, de reflexão e seriedade, então as
pessoas nada dizem... Ou elas dizem que você fala demais. Isso
quando não procuram um motivo para rir, mesmo quando a piada parece
inexistente! Você pode ver isso com frequência na rede: as pessoas
não levam nada a sério, mesmo quando isso se faz necessário, e
ainda tentam forçar uma piada, mesmo quando ela não é bem vinda!
Eu
sei. Tudo isso parece ser a carta de um indivíduo desprovido de
senso de humor, de um ranzinza com a face carrancuda, não é
verdade?
Os
mais sisudos sentem uma necessidade de justificar seus argumentos
reafirmando o que disseram anteriormente, mas os risonhos, estes nunca
pareceram sentir a obrigação de justificar a sua risada
involuntária.
Repito:
é melhor rir do que chorar.
Eu
aprendi nesta vida a debochar de mim mesmo e a não ser tão
autocrítico, e também aprendi a ter uma leve incredulidade para
cima da minha eterna síndrome de perfeccionismo sobre tudo o que
faço e a olhar para mim mesmo sob um olhar cínico e rir, o que é
muito saudável e quebra a monotonia de tentar ser assim tão
correto. Eu aprendi a não ter a pretensão de querer ser o maior
exemplo de perfeição, pois ninguém o é.
Repito:
é melhor rir do que chorar.
Mas
eu pelo menos nunca ouvi alguém dizer que o oposto exato do riso
seria o choro!
E
eu sei rir.
Conte-me
uma boa piada, das mais simples, que são aparentemente tolas, até
aquelas originadas no território do inusitado, das mais absurdas, e
eu saberei rir.
O
ponto nunca foi esse!
Considere
isso como uma extensão ao tema da língua ferina e dos dedos afiados. Há uma ligação muito forte entre a síndrome de hiena e a
falta de tato no que se diz, com a diferença de que as hienas não
existem apenas no mundo virtual, mas caminham entre nós em ambientes
públicos, e elas podem ser encontradas das portas para dentro e das
portas para fora. E elas podem existir dentro de nós, contagiantes
como são.
E
as hienas opinarão sobre assuntos sérios como se estivessem
contando uma piada!
E
as hienas certamente vão rir dentro de uma sala do cinema mesmo
durante certas cenas que demandam seriedade ou um pouco de silêncio
para fins de efeito de imersão. E elas vão arreganhar os dentes se
forem contrariadas. Nem mesmo as hienas suportam por muito tempo o
seu próprio sorriso sardônico!
E
as hienas falarão de política com um certo ar de deboche, ainda que
os diretamente envolvidos com ela tenham o costume de fazer o mesmo!
E
elas vão rir, e rir, e rir... pois, quando são contagiadas por essa
hilaridade cega e irrefreável, isso é tudo o que as pessoas sabem
fazer.
E
encerro aqui deixando-lhes um alerta: tenham cuidado com as hienas!
Elas estão
em todos os cantos e querem a sua carne e um minuto de sua atenção.
Não se deixem enganar por seu eterno sorriso e por sua natureza
carniceira disfarçada de senso de humor!
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